Criei um grupo de apoio sobre autismo depois dos gêmeos
Mariana Alckmin
Mãe do Gabriel e Daniel
♥ “Queria oferecer aos pais novatos na estrada do autismo o suporte que eu não recebi”
31.03.2016 – Sempre sonhei em ser mãe. Casei bem cedo, com 23 anos.
Sou fisioterapeuta de formação. Trabalhava, fazia pós graduação, mestrado, mas estava faltando algo em minha vida. Então com 29 anos decidi que era hora de ser mãe. Foram 6 meses de tentativa e pronto: estava grávida, e para minha maior e melhor surpresa eram 2!!! No primeiro ultrasson já fiquei sabendo que eram gêmeos univitelinos.
Daí em diante os sonhos dobraram de proporção. Pensava em 2 nomes para meninas e 2 nomes para meninos. E por volta da 16ª semana de gestação descobri que seriam 2 meninos. Minha gestação foi perfeita sem nenhuma intercorrência.
No dia 13/08/2009 tive contrações e ocorreu o parto cesárea. Confesso que não teria coragem para ter o parto normal. Nasceram Gabriel e Daniel com 2 quilos cada. Ficaram 6 dias na UTI neonatal para ganhar peso e finalmente fui para casa com meus 2 pacotinhos.
Chegaram os menininhos que iriam mudar minha vida e eu pensava que já sabia…
Criei um grupo de apoio sobre autismo depois dos gêmeos
Amamentava no seio e complementava com a mamadeira. Sempre tinha alguém me ajudando: mãe, sogra, tia e primas, família é tudo! E assim foram crescendo Daniel e Gabriel, alcançaram todos os marcos do desenvolvimento: sustentaram a cabecinha com 4 meses, rolaram aos 5, sentaram aos 6, engatinharam aos 9, andaram com 1 ano e 1 mês.
“Estava tudo correndo bem exceto a fala que não vinha.”
A mãe fisioterapeuta não se preocupava até então. Estava tudo correndo bem exceto a fala que não vinha. Mas o pediatra dizia que era assim mesmo: gêmeos demoram para falar, meninos demoram mais para falar. Não era para eu me preocupar que a fala iria sair.
Mas vovô e vovó muito experientes, pois tiveram 4 filhos, notaram algo de estranho nos netos. Eles não jogavam beijinho, não davam tchau, não brincavam de piscadinha, essas coisas bonitinhas de bebê. Vovô e vovó ficaram muito preocupados havia algo de errado naqueles meninos, foram pesquisar (pasme na Barsa) a palavra autismo e pronto enxergaram os netos naquela descrição de enciclopédia.
Haviam outras características sim:
Eles não brincavam com os brinquedos como crianças típicas. Eles tinham um jogo de encaixe de argolas e adoravam girar uma determinada argola. Encaixar para que? Girar era muito mais divertido.
“Eles não atendiam quando chamados pelo nome.”
Eles estavam em um ambiente e podiam entrar e sair pessoas desse ambiente que eles permaneciam indiferentes.
E a fala que nunca aparecia.
Sentindo-se responsáveis pelos netos (eram os primeiros), procuraram o melhor médico de São Paulo, especialista em autismo e marcaram uma consulta.
Em fevereiro de 2010, fui com meus pais levar as crianças (que estavam com 1 ano e 6 meses) para a consulta, que para mim, até então, seria com o pediatra especialista em fala. Meu marido nem soube dessa consulta, só depois.
O médico especialista começou a me fazer uma série de perguntas: eles respondem quando chamados pelos nomes? Eles dão tchau? Eles jogam beijinho? Eles brincam de piscadinha? Eles brincam de cadê achou? E eu respondendo a tudo com um sonoro não.
Depois da série de perguntas o médico viu os meninos, viu um, viu o outro, viu os dois juntos e pediu para filmá-los. Eu não tive reação. Permiti a filmagem e já pensei: ele vai achar algo de errado. Então o médico pediu para os meninos saírem da sala e disse as seguintes palavras:
“Não estou fechando o diagnóstico, pois seus filhos não tem idade para isto, mas eles têm características de crianças autistas”.
Soco no estômago. Desabei a chorar ali mesmo. Saí do consultório com as seguintes recomendações: fonoterapia e escola para ontem. No mesmo dia matriculei os meninos em uma escolinha pequena de bairro perto de casa seguindo orientações médicas.
A noite fui dar a notícia para meu marido, nunca vou me esquecer da cena, ele estava jantando, na mesma hora parou tudo. Ele ficou sem reação, paralisado.
“Nosso sonho havia sido roubado”
A partir de então a nossa vida nunca mais foi a mesma, nosso sonho havia sido roubado. No início quis esconder até dos meus irmãos. Fiquei muito brava quando meus pais contaram para meus irmãos, não queria que ninguém soubesse. Briguei com Deus: por que eu?
“Tudo que eu imaginava para os meus filhos perdeu sentido, agora precisava lutar por eles.”
Tive que descobrir tudo sozinha, não conhecia ninguém com filho autista. Até então autismo para mim tinha o esteriótipo daquela criança que permanecia isolada no canto do quarto abanando os braços. Comecei a ler, pesquisar, comprar livros.
Os meninos faziam fonoterapia e psicologia (terapia comportamental ABA). Descobri sozinha a integração sensorial e a musicoterapia. Os meninos faziam todas as formas de atividades extra escolares: natação, atividade motora para crianças. Frequentávamos parques, festas e todo lugar que houvesse criança por recomendação médica.
Já vivíamos em função deles desde o nascimento, mas depois dessa hipótese diagnóstica, vivíamos só para eles.
E o tempo foi passando, aos 3 anos houve a confirmação do diagnóstico, os meninos estavam dentro do espectro autista. No fundo eu tinha esperança de que aquela hipótese diagnóstica não fosse se confirmar, mas infelizmente ela se confirmou.
“No fundo eu tinha esperança de que aquela hipótese diagnóstica não fosse se confirmar, mas infelizmente ela se confirmou.”
E agora? O que fazer? Só me restava aceitar e batalhar por eles, e foi isto que fiz.
Hoje, passados 5 anos, tenho o maior prazer em falar dos meus filhos, mas no começo não foi tão simples assim, abdiquei de minha profissão para ficar com eles e sei que sou privilegiada por fazer isto, quantas mães queriam fazê-lo e não podem. Os custos são altos, as terapias caríssimas, profissionais qualificados são poucos.
“Mas não bastava fazer só pelos meus filhos. Queria ajudar outras famílias. Outras mães que estavam passando por tudo aquilo que passei.”
Foi aí que surgiu a ideia de criar um grupo de apoio aos pais. Então nasceu o TEApoio (Grupo de Apoio a Pais e Familiares de Autistas). Tudo começou sem muita pretensão. Criei um grupo no whatsapp com algumas amigas que fiz ao longo desses 5 anos. Fiz muitos cursos, frequentei muitos consultórios e conheci muita gente.
“Então nasceu o TEApoio”
Queria oferecer aos pais novatos na estrada do autismo o suporte que eu não recebi.
Se lá atrás alguém mais experiente tivesse me acolhido, me orientado ou simplesmente me abraçado dizendo: olha você não está sozinha, posso te ajudar, teria sido muito mais fácil.
Hoje, o TEApoio conta com mais de 200 famílias na cidade de São Paulo e grande São Paulo.
Fazemos um encontro científico mensal gratuito onde convidamos profissionais qualificados para falarem para os pais.
Fazemos encontros sociais (festas juninas, festas em buffets, piqueniques), afinal ninguém é ferro e precisamos nos divertir também!
E apoiamos a ONG Projeto Amplitude que atende crianças autistas carentes na cidade de São Paulo.
Dia 02/04 é o Dia Internacional da Conscientização do Autismo. Faremos um encontro no domingo, dia 3, às 10:00 horas da manhã no Parque Ibirapuera para divulgarmos nossa causa e levarmos adiante a bandeira do autismo.
“Essa é a nossa missão: conscientizar a sociedade sobre os autistas e lutar por seus direitos. Afinal nossos filhos são nossa vida!”
#juntospeloautismo.
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