Restrição alimentar não é um bicho de sete cabeças
05.07.2016 – Em 2007 descobri a Doença de Crohn, que é uma Doença inflamatória crônica do intestino que afeta o revestimento do trato digestivo (Saiba mais). Com ela, veio uma das maiores transformações alimentares da minha vida. Se você se irrita em fazer dieta, não imagina o que é ouvir de um médico que você NÃO pode mais comer lactose. Você já parou para pensar quais são os alimentos que você precisará tirar da sua vida? Vou falar só um: leite! Pronto! Com ele, outras delícias, como chocolate, queijo e todos os milhares de derivados. Na ala das sobremesas, sobram as frutas e suas compotas, os quindins, as paçocas e os suspiros (rsrs). Com certeza deve haver outros, mas foram esses doces que comi por seis anos.
Restrição alimentar não é um bicho de sete cabeças
Após esse período, fui a outro médico, especialista nessa doença, que me pediu novos exames e, após analisá-los, me disse:
“Michelle, você não tem alergia à proteína do leite, você apenas é intolerante a lactose!”
Oi?!?!?
Acabei de passar anos da minha vida sem comer uma “santa carolina”, doce divino de massa de bomba com recheio de doce de leite, e agora o médico fala que eu posso comer o que tiver leite? Como assim? Bom… não preciso nem dizer que a parada obrigatória, saindo do médico, foi uma padaria (lugar de que peguei ódio depois dessa restrição).
Depois de um ano tomando novamente leite e comendo seus derivados, ou seja, tudo com lactose, meu intestino inflamou novamente! Lá fui eu descobrir o porquê. Após alguns testes e consultas, descobri que, além de ser intolerante à lactose, também tenho sensibilidade ao glúten, carne vermelha, corantes e outro pacote de frutas, verduras, grãos e castanhas, que desregulam a felicidade da minha parede intestinal.
A Doença de Crohn é um aprendizado diário.
Cada pessoa tem sintomas e reações diferentes e descobre as suas restrições no dia a dia. Resumindo: EU tenho uma ENORME restrição alimentar e, depois de ter raiva de tudo isso e ter socado várias almofadas sozinha no quarto, precisei respirar fundo e me adaptar a essa nova forma de viver.
A bebida de soja, por exemplo, foi um dos alimentos mais presentes na minha rotina na primeira fase da descoberta da doença. A tapioca, a descoberta da segunda fase. Sem contar a variedade de produtos que o mercado oferece e para os quais normalmente nem olhamos ao passar pelas prateleiras dos supermercados quando não precisamos inseri-los no carrinho.
No meu caso, eu não sou alérgica a esses alimentos, mas, sim, intolerante! Algumas pessoas me perguntam a diferença de um para o outro. O que os médicos me ensinaram:
Intolerância X Alergia
Vou usar o leite como exemplo, já que ele foi o produto sobre o qual mais busquei informação nesses últimos anos.
Normalmente, as pessoas que possuem intolerância a lactose (carboidrato presente no leite de vaca) apresentam dificuldade para a digestão e a absorção completa dessa substância devido à ausência ou à deficiência da enzima lactase, responsável pela quebra da lactose (o açúcar do leite). Se essa enzima é pouco produzida ou não está presente no organismo, podem-se apresentar desconfortos gastrointestinais, como diarreia, dores de barriga, inchaço no abdômen e flatulência.
No meu caso, após descobrir que era intolerância e não alergia, eu passei a consumir os laticínios comuns nas versões sem lactose e as bebidas de soja.
A alergia à proteína do leite de vaca exige a exclusão do produto e de seus derivados, porém esses alimentos são importantes fontes de nutrientes, como o cálcio. Algumas crianças, nos três primeiros anos de vida, possuem essa alergia (conhecida como APLV – escrevemos uma matéria sobre esse assunto aqui no site, veja aqui, e a exclusão pode prejudicar o crescimento normal e a qualidade nutricional da alimentação. Nesse caso, as bebidas à base de soja também podem ser boa opção, por possuírem proteínas completas e serem enriquecidas com as mesmas quantidades de cálcio do leite, além de vitaminas e zinco.
Por seis anos eu tomei a bebida de soja pela manhã misturada ao café. Toda mudança alimentar causa um estranhamento no início, mas ao longo do tempo passamos a apreciá-la com outra memória gustativa. Quem gosta de comida japonesa deve lembrar a primeira vez que experimentou. A textura, a temperatura e o sabor do peixe cru eram estranhos. Na terceira ou quarta vez que comemos dessa culinária – pelo menos a grande maioria –, passamos a desejá-la. Comigo aconteceu isso toda vez que precisei mudar. Caso aí na sua casa, você, seu filho ou outra pessoa de sua família sintam algum desconforto com a alimentação, não tenham medo!!! Procurem um médico e descubram o porquê dos desconfortos, depois abracem essa nova opção e acreditem no poder da felicidade que essa transformação irá causar.
Hoje confesso que sou muito feliz! Minha alimentação é linda e cheia de produtos que só me ajudam a ser mais saudável! Talvez, se eu não tivesse descoberto essa doença e passado 9 anos (sim, repetindo: 9 anos) conversando com os sinais do meu corpo, eu jamais estaria comendo coisas tão nutritivas e alimentos tão importantes para mim. Nosso intestino é nosso guia. Ele precisa estar funcionando bem para caminharmos melhor! Busque o seu caminho e ajude a sua família a fazer o mesmo! A restrição alimentar não é um bicho de sete cabeças!