Engessei a mão do meu filho para ele parar de chupar os dedos!
Silvia Delman
Mãe do Fred e do Guilherme
♥ “Tinha dentro de mim a certeza absoluta de que estava fazendo o melhor pelo meu filho, ajudando ele a parar de chupar os dedos, e isso me deu serenidade para seguir esse processo que para muitos pode soar absurdo ou excessivo.”
21.09.2016 – Meu filho chupava os dedos! Que alívio escrever essa matéria com o verbo conjugado no passado…!
Como breve introdução, no intuito de evitar polêmicas: Atenção, essa solução que encontrei para ajudar o Guilherme a parar de chupar os dedos funcionou para nós e é bem pouco ortodoxa, provavelmente não se encontra em nenhum manual e não faça parte das orientações de nenhum profissional. Esse foi um “Protocolo Materno” que serviu apenas para mim. Para as mães que me conhecem e me acompanham sabem que trabalho com acolhimento materno e sou militante convicta da filosofia da maternidade real e da maternidade possível, compreendendo que cada decisão materna é tomada dentro de um contexto particular. Por isso, sem julgamentos, por favor! Esse é apenas um compartilhamento da minha experiência e não a pretensão de uma verdade absoluta (Psiu, segredinho: na maternidade, especialmente, verdades absolutas não existem!)
Esclarecimento feito, vamos à saga: foram quase 3 anos de uma jornada desafiadora! Meu filho mais novo, o Guilherme, tinha um hábito chamado de sucção digital, ou seja, chupar os dedos! Ele chupava dedo desde o útero, continuou depois que nasceu, e a situação só foi piorando, a ponto dele chupar os dedos constantemente, de dia e de noite, a qualquer hora e em qualquer lugar. Nos últimos tempos estava, inclusive, deixando de brincar com a mão esquerda para “preservar” os dedos limpos e poder chupá-los a qualquer momento.
Sim, você leu certo, dedos com “S”no final, no plural! Ele não chupava apenas um dedo. Ele chupava os dois!
E ainda tinha uma posição muito peculiar de chupar os dedos: com o cotovelo acima do ombro chupava os dois dedos – o indicador e o dedo médio – projetando as digitais contra o palato e forçando os dentes para frente. De chorar!
Desde o início tentei, em vão, impedir que o vício se instalasse: inicialmente por supor ser uma necessidade de sucção não nutritiva tentei substituir o dedo pela chupeta. Foram inúmeras marcas e modelos, cheguei a ter um verdadeiro acervo de chupetas, mas nenhuma foi aceita. Ele preferia chupar os dedos, e assim, eles venceram pela primeira vez.
Depois veio a luva, na tentativa de criar uma barreira, e impedir que os dedos chegassem à boca. Em vão: ele tirava e conseguia chupar os dedos. Os dedos venceram pela segunda vez.
Então parti para a possibilidade de tornar o dedo “menos agradável” e comecei a besuntá-los com sabores que julgava não serem desejados. Fui de numa escala light como o sumo do gengibre (que para meu desespero foi saboreado como um tempero divino), passando pela raiz forte, que também se mostrou inócua, até chegar na escala do molhinho de pimenta, que passou do convencional até o pico “hard core” do temido Tabasco. Sem sucesso! Ele chupava, ardia a língua, ele reclamava – “adido, adido” – e logo na sequência voltada a chupar os dedos até conseguir eliminar todo o ardor e poder voltar a chupar os dedos confortavelmente. Desesperador! Eram os dedos vencendo pela terceira vez.
Minha angústia era enorme por acompanhar o desenvolvimento infantil de perto, em função do meu trabalho, e por ter uma irmã dentista, especialista em ortodontia, e assim conhecer exatamente todas as consequências e eventuais prejuízos que esse vício de chupar os dedos poderia trazer.
Eu precisava conseguir ajudar meu filho. Estava segura de que esse era o melhor!
No caso do Guilherme a situação ainda se agravava, pois toda a “chupação de dedo” estava associada a uma outra característica dele: uma hipermobilidade articular (flexibilidade além do convencional) que fazia com que ele já apresentasse uma separação desses dedos dos demais e uma leve rotação dos dedos sugados, que se acentuava a cada dia. Os efeitos do vício já eram visíveis.
Fui à um ortopedista muito competente, querido e acolhedor, que entendeu minha angústia e tentou percorrer por um caminho mais convencional, me indicando uma terapeuta ocupacional. Trabalhamos juntos, em equipe. Usamos a técnica de esparadrapamento dos dedos que não resolveu. O Guilherme continuava a chupar os dedos, e com a saliva, ele amolecia o esparadrapo e o retirava com facilidade. Quatro a zero para os dedos.
Evoluímos para uma tala, da qual, com sua habilidade circense, ele facilmente se desvencilhava dela. Ele conseguia chupar os dedos, e depois, os retornava para a tala, como se fosse apenas uma “capa protetora”. Assim a tala se mostrou apenas uma solução para ele (e não para mim!), já que permitia que ele usasse a mão livremente sem sujar o dedo. Os dedos venciam pela quinta vez.
Fui então para uma abordagem terrorista: fotos horripilantes de dedos tortos e necrosados, bocas deformadas, dentes projetados para frente, no intuito de impactá-lo com as possibilidades do que poderia acontecer com ele. Nível de sucesso zero. Os dedos venceram pela sexta vez.
Com sentimento de impotência fui para o Google, e em um grupo da internet, ouvi falar de um esmalte milagroso, importado, infalível, que rompia qualquer resistência, amargo como fel (o que realmente é) e que, claro, custava uma pequena fortuna. Como toda mãe sabe, assim como eu, desespero de mãe não tem preço: comprei o frasco do produto fantástico que seria a solução definitiva, mas que só teve esse nome até que eu testasse no pequeno. Ele displicentemente fez cara de reprovação e desagrado e respondeu: ‘amago, amago’ , adotou o mesmo procedimento que tinha usado na ocasião da pimenta e seguiu ao seu ritual de sucção, sem grandes abalos.
Minha sétima derrota para os dedos!
Cogitei desistir, mas, analisando novas possibilidades, tive um pensamento desesperado de que ele apenas não chuparia o dedo se não tivesse a mão! Plim! Eureka!
Agora eu precisava viabilizar o plano e pensar em como deixá-lo sem a mão por um tempo. Comecei a ler, estudar e encontrei trabalhos sobre terapia restritiva (que com outros objetivos trabalha com a restrição de um membro), pensei nas inúmeras crianças que sofrem acidentes de infância e passam longas semanas com o braço engessado e acesso restrito ao membro!
Era isso! Se eu engessasse a mão do Guilherme, ele não teria como chupar os dedos ou tirar o bloqueio!
Me enchi de esperança. No meu caso, o que seria um “gessinho” na mão por poucas semanas, considerando que eu já tinha uma certa expertise nesse assunto, uma vez que o meu filho mais velho necessitou de um tratamento ortopédico desde muito cedo e por longos 6 meses. Seria bolinho… e foi! Difícil foi encontrar um profissional que encarasse essa comigo.
Procurei um novo ortopedista, e além de querido e acolhedor, ele tinha que ter uma outra característica fundamental para me entender: ser pai e casado com uma mãe! (mãe quando põe uma coisa na cabeça perde a cabeça, mas não larga da ideia!). Achei! Relatei toda minha jornada com as inúmeras tentativas que acabei de relatar nessa matéria, ele me ouviu calmamente, e me perguntou (acho que para me testar):
– “E se eu falar que não vou engessar?”
E a minha resposta estava pronta:
-“Vou te agradecer, mas não vou desistir, engesso eu mesma, experiência eu tenho, já vi engessarem meu outro filho um milhão de vezes, só preferia que fosse feito por um profissional”.
Não sei se o argumento foi bom, ou se ele quis livrar o menino das minhas mãos não habilitadas para tal, mas ele se convenceu e “decidimos” (eu já estava bem decidida!) engessar a mão do Guilherme. Ele colocou como condição realizarmos trocas de gesso semanais, para que pudéssemos liberar a mão para movimentos e avaliar o andamento desse “protocolo”. parar de chupar os dedos
Com medo do meu filho chupar o dedão pedi para o ortopedista engessar um bloco único (todos os dedos para dentro). Decorei o gesso com as Tartarugas Ninja, mas o mesmo não durou nem 24 horas, pois meu pequeno ninja encontrou uma forma de tira-lo da mão. Voltei no ortopedista. Novo gesso. Dessa vez com o dedão pra fora para “travar” o gesso. Esse decorei de Homem Aranha (quem sabe a teia dava uma amarrada! rs). Deu certo. Uma semana. Troca de gesso. Segunda Semana. No que seria a terceira troca de gesso, eu precisei adiar a consulta e o Guilherme ficou 2 dias sem o gesso. E para minha alegria ele NÃO chupou o dedo!!!
Conversei com o médico e disse que aguardaria alguns dias para observar se seria necessário continuar engessando, mas para minha surpresa, e alívio, ele conscientemente já não colocava mais os dedos na boca. Passei a observar que, apenas durante o sono, inconscientemente, ele levava o dedo a boca. Achei que não seria necessário manter o gesso o dia todo e a mão restrita se o “problema” era somente enquanto dormia. Decidi que por um tempo enfaixaria a mão dele, depois que ele pegasse no sono, para quando os colocasse na boca a consistência não seria agradável e ele afastaria.
Deu certo. Depois de sete derrotas veio a vitória da mãe sobre os dedos!!!
Gosto muito das terapias integrativas, que fazem parte dos cuidados que tenho com a minha família e com as mães e bebês com que trabalho, e vou registrar aqui que quando decidi engessar, fiz em paralelo, um trabalho de acolhimento emocional e de suporte para eventual ansiedade gerada pela falta do dedo, com o uso de alguns florais e óleos essenciais e o processo foi bem tranquilo, sem nenhum tipo de stress, choro ou drama de qualquer ordem.
Foi difícil?! Não para ele, que no final não “sofreu” nada e até curtiu ter mãos de super heróis, não pra mim, que estava convicta de estar fazendo o certo, mas como toda decisão que tomamos no exercício da maternidade, tive que enfrentar olhares de julgamento e reprovação. Mas faz parte! Claro que seria mais fácil, diante dos questionamentos sobre o gesso, dizer que ele machucou a mão, mas isso é quase impossível quando a criaturinha de 3 anos que tudo sabe responde por conta própria:
-“Tadinho, você machuchou a mãozinha?
E ele:
– “Não, eu tenho ‘zesso’ porque eu ‘tupo’ dedo!”.
Fato é que hoje, Guilherme não tem mais o vício de chupar os dedos. Dorme tranquilo. Brinca tranquilo e passa o dia sem nem lembrar que chupava os dedos. Até a fala já apresentou melhoras. Foi muito trabalhoso para ele parar de chupar os dedos, cansativo, desgastante, demandou muita energia e pensei em desistir. Mas posso dizer que valeu a pena. Por mim e por ele.
Imagino que muitas mães devem estar pensando que foi uma solução muito radical para Guilherme parar de chupar os dedos, talvez desnecessária ou mesmo que chupar os dedos não seja tão grave assim. Compreendo e respeito. Mas busquei as minhas respostas, segui meu coração e a minha intuição de mãe.
Tinha dentro de mim a certeza absoluta de que estava fazendo o melhor pelo meu filho e isso me deu serenidade para seguir esse processo, que para muitos, pode soar absurdo ou excessivo. A verdade é que eu ajudei meu filho a parar de chupar os dedos!
Esse é um capítulo da NOSSA história que compartilho aqui a pedidos. Encerro com meu desejo sincero de que cada mãe, na SUA busca para a solução dos SEUS desafios encontre SUAS próprias respostas e seja feliz exercendo escolhas conscientes. parar de chupar os dedos
Sílvia Delman,
advogada, doula e educadora perinatal,
trabalha com assistência ao parto e acolhimento materno
e mãe do Frederico de 5 anos e do Guilherme de 3 anos.